Aline
COMO QUEM CHORASalmos, 6Senhor, meus ossos estão perturbados!Sabes o quanto sou fraca:custa-me suportar as setas inimigaslançadas a esmo contra mim,que caminho muitas vezes ao léu,silente e ensimesmada,triste, macambúzia,envergonhada de minha debilidade;sem saber que fazer de mim,à espera de um amparo,um arrimo, um carinho,que não acontecem,não me surpreendem num aceno,convidando-me a ser feliz- ao menos por um tempo...Por isso escrevo salmos"como quem chora"- de melancolia, solidãoe desencanto.E então recorro a ti, Amigo,pois nem mesmo tuescapaste a verter lágrimas:quando viste Lázaro choraste,ainda que conscientede que logo ressuscitaria,e sua morte e ressurreiçãopelos séculos dos séculosproclamada seria.Por amiúde me entristeceré que venho a tie te confesso:Pai, sou fraca.Ajuda-me a ser forte!Sara-me, por tua misericórdia;não me deixes permanecernos braços da inquietaçãoe da abulia;dos tentáculos do desânimoe do negativismo me arranca,ainda que me doa e fira,como o puxar do farpão.Recupera-me quanto antes,eu te peço,permitindo que tua alegriaseja a minha força,como foi dito em Neemias.Venho te perguntando dia após dia:"Até quando? Até quando?..."Sei que não és verdugo, senhor feudalviolento e vingativo; pelo contrário:apressas-te a curar o combalido,reestruturar o partido,soldar os ossos quebrados do injustiçado,restaurar a pele ao escalpelado.Só que me nego a esperarresposta e socorroaté as vésperas da morte;até aquela horaem que "a indesejada das gentes"de mim tentar se aproximar.Na morte não há recordação de ti;ela é para a eternidade;não há retorno ao mundo e à vida.No sepulcro não te poderei louvar:terei os lábios para sempre cerrados.Estou cansada de tanto gemer,ainda que hoje meus lamentos e prantosão implosões no peito,não mais murmuraçõese lamúrias contínuas- tal chuva no telhado,como antigamente...Meus adversáriostentam abater-me o semblante,murchar-me os olhos,envelhecer-me.Não aceito!Quero ser como a águia,que atinge os mais altos picos;como a andorinha, que corta os céus,nunca enfadada, mas lépida,as forças e a levezasempre renovadas.Então desperta-me o vigorda mulher primitiva, Senhor:sem truques e sem desgastes,altaneira e altivaem minha segurança.Se me deixar dominar pela tristezatornar-me-ei escrava,incapaz de criar alegriapara mim e os que amoou me cercam.Senti ímpetos de escrever, e escrevi;e... o que escrevi, escrevi...Não o digo como Pilatos,mas pela força do Espírito,que agora me inspira a declarar:"Apartai-vos de mim todosos que praticais a iniqüidade,porque o Senhor ouviua voz dos meus lamentos,acolheu a minha oração,graças a ele!Envergonhados poissejam todos os meus inimigos;retirem-se de súbito,cobertos de vexame!"[Poesia de Allinges Lenz César Mafra]
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